“A Fragilidade do Nó Cego – O Casamento na Igreja Cristã, Católico-Romana – O Divórcio e o Segundo Casamento”, eis o título e subtítulos do livro do padre Costa Pinto, apresentado em Viseu (em Lisboa a apresentadora foi a historiadora Fina d’Armada) pelo prof. Dr José Manuel Pureza, do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, na passado Sábado, 16 de Março, no acolhedor salão da Associação de Solidariedade Social dos Professores.
Assumindo-se como católico praticante, José Manuel Pureza, (que ainda recentemente escreveu um artigo no suplemento “Q”, do Diário de Notícias, sobre “Recuperar a ideia de Jesus que muda as nossas vidas”), começou por considerar preocupante que se ande a “falar muito no Papa, mas pouco ou nada sobre Jesus”, lamentando que a sua proposta de vida, extraordinariamente interpeladora e transformadora, se tenha “liofilizado e acabado por diluir nas estruturas de poder próprias de uma religião”, substituída pela obediência resignada a dogmas”, que repudia tanto na religião quanto na política (recordo que José Manuel Pureza é dirigente do Bloco de Esquerda).
O livro do padre Costa Pinto, na leitura do apresentador, destaca dois traços da tradição da Igreja católica: a menorização do estatuto social das mulheres e “a paranóia anti-sexual” que se manifesta no culto da virgindade, na afirmação de S. Jerónimo (Séc. XV) de que “a relação sexual incapacita para a oração” ou na correcção de Pio XII a um texto do Séc. XVI, acrescentando piedosamente que Tobias rezou três dias e três noites antes de ir para a cama com sua esposa Sara.
O livro fala da “contradição indissolúvel entre a vida de Jesus e a tradição católica que desconfia do matrimónio, que o canoniza, mas condena o divórcio e pune os divorciados recasados, esquecendo que o Concílio Vaticano II realçou a centralidade da consciência, livre da coacção externa de qualquer autoridade humana, na resolução dos problemas morais que surgem na vida individual e social”.
José Manuel Pureza concluiu a sua apresentação afirmando que “o casamento só pode ser um acto livre de expressão do amor, pelo que o discurso da indissolubilidade é a apologia estóica (ai aguenta, aguenta!) do sufoco”.
Por seu lado, o padre Costa Pinto admitiu que o objectivo do livro foi suscitar a discussão de forma teologicamente sustentada (demorou cinco anos a escrevê-lo) sobre a exclusão da Igreja dos católicos recasados, o considera um problema pastoral anti-evangélico.
PAPA FRANCISCO OU PAPA CHICO?
Por curiosa coincidência, no mesmo dia da apresentação em Viseu do livro do padre Costa Pinto, um outro padre, Anselmo Borges, teólogo e professor de Filosofia na Universidade de Coimbra, escrevia no DN, a propósito do novo Papa: “A Igreja não pode entender-se como uma gigantesca empresa multinacional religiosa ou um aparelho de poder: As mulheres não podem ser discriminadas. A moral sexual pede revisão, bem como a lei obrigatória do celibato, que deve ser opcional. Decisiva é a reforma da Cúria, verdadeiro cancro da Igreja”.
Será o Papa Francisco, que tanto entusiasmo parece concitar entre os fieis da segunda maior religião do mundo (16%) , logo a seguir à muçulmana (22%), capaz de levar a cabo semelhante tarefa? Há quem acredite que sim com a mesma fé com que acredita em milagres. Mas há quem tenha ficado desiludido com a escolha dos cardeais. É o caso da Associação Rumos Novos – Homossexuais Católicos” devido às posições fundamentalistas do ex-arcebispo Bergoglio contra a homossexualidade e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Também associações de direitos humanos da Argentina e familiares e amigos das vítimas de torturas e assassinatos da ditadura militar (incluindo 150 sacerdotes e freiras e trinta mil “desaparecidos”,muitos deitados ao mar a partir de aviões da marinha, muitas vezes com a bênção de sacerdotes) acusaram o novo Papa de ter sido, juntamente com a hierarquia da Igreja argentina, cúmplice da ditadura que se vangloriava de “limpar a Argentina de comunistas e ateus”. Dois padres jesuítas, Orlando Yorio e Francisco Jalics, denunciaram que, há 37 anos, o provincial Bergoglio os entregou aos militares que os raptaram e torturaram, por não apoiar o seu trabalho nos bairros pobres. Bergoglio disse que só recentemente teve conhecimento do rapto de bebés por parte dos militares, distribuídos pelo Movimento de Famílias Cristãs, mas uma família denunciou que, há 35 anos, lhe pediu ajuda para reencontrar a filha, nascida numa esquadra da polícia e imediatamente levada para parte incerta, e a resposta que tiveram foi que a menina se encontrava em boas mãos.
Não será por acaso que, apesar de 90% dos argentinos se considerarem católicos, apenas 22% se assumem praticantes.
Que o Papa tenha feito um telefonema sem a ajuda de ninguém, ou que tenha andado de autocarro, apontados como sinais de humanidade, não chega para mitificar mais um “príncipe da Igreja”(só uma monarquia absoluta como o Vaticano é que se lembraria de uma designação destas). A prova dos nove seria acabar com a lavagem de dinheiro da mafia no Banco do Vaticano IOR, investigado pelo Banco Central de Itália, acabar com a protecção dos padres e bispos pedófilos praticada por João Paulo II e Ratzinger (mais do que Bento XVI), acabar com a discriminação sexual, de género e homofóbica, e, por último, trocar a protecção de padres ultra-reaccionários e fundamentalistas, apoiantes das ditaduras mais criminosas do mundo, como Monsenhor Lefebre (que Ratzinger reintegrou) pelo apoio aos padres e teólogos progressistas excluídos por João Paulo II e Bento XVI, como Hans Kung, Garry Wills, Ernesto Cardenal, Frei Betto e todos os da Teologia da Libertação, que na América Latina se empenham na emancipação social dos mais pobres. Será mais fácil Cristo descer à Terra do que achar um Papa cristão? Ou será que Cristo aproveitaria para expulsar os vendilhões do Vaticano e abolir o papado?…
Carlos Vieira e Castro